Portugal muda a avaliação nas escolas

Entre as medidas, estão o fim de exames externos e a volta da autonomia das escolas para realizar provas

Por Maria Márcia S. Malavasi

Artigo publicado originalmente no blog Avaliação Educacional no dia 29 de maio de 2016

Maio de 2016 é um mês bastante importante para a educação portuguesa já que um novo modelo no sistema de avaliação será anunciado e implementado pelo jovem ministro da Educação Tiago Brandão Rodrigues.

Dentre as propostas já aprovadas no Parlamento constam o final dos exames externos de Português e Matemática para o 4o ano e voltam as provas internas ou provas de aferição para os 4º. e 6º. anos a serem aplicadas a partir do próximo ano, de acordo com o calendário estabelecido por cada escola. Ou seja, a escola volta a ter autonomia para realizar as provas que considere importantes para verificação do que sabem ou não seus estudantes. Essa prova não contará para a nota final e nem será obrigatória. Poderá ainda ser aplicada de maneira censitária ou amostral para estudantes do 2o, 5o  e 8o anos.

No Parlamento já foram decididos também o final  dos teste para professores e o teste de Língua Inglesa de Cambridge para alunos do 9o. ano.  O Bloco de Esquerda (BE) quer inclusive a divulgação dos valores gastos pelo Estado para a realização do teste de ingles que era responsabilidade de Cambridge e de empresas privadas associadas ao projeto.

Outra medida a ser reavaliada diz respeito às metas curriculares que para o atual ministro da educação trazem em si uma mudança de paradigma. “No currículo as disciplinas de Português e Matemática, denominadas fundamentais, tinham centralidade. Agora é preciso dar a mesma ênfase as chamadas “competências transversais”, as artes, ao desporto e as ciências experimentais.”

O atual ministro da Educação anuncia também a diminuição do teto do número de alunos nas salas de aula da primeira fase do Ensino Fundamental, chamado primeiro ciclo, para menos de 25.

Se no governo anterior os exames nacionais eram vistos como exigência e garantia do controle da qualidade do ensino, no atual governo as provas de aferição ganham estatura por não terem impacto na nota final do aluno. Pareceristas e órgãos consultivos se manifestaram, como o Conselho Nacional de Educação, elaborando um relatório, onde indica que os exames nacionais não alteram de forma significativa as notas finais dos alunos. Outra medida que chega ao final é a bolsa de contratação de escola (BCE). Esta forma de contratação de professores para as escolas foi criada para evitar concursos. Apesar de resolvida a fórmula que colocou professores nas escolas de forma rápida, ela é considerada um equívoco, pois os professores foram contratados temporariamente, sem concursos e nem efetivação a partir de 2014.

A deputada Joana Mortágua do Bloco de Esquerda, repetindo argumentos das Associações de professores de Português e de Matemática, afirma que “os primeiros quatro anos de escolaridade passaram a funcionar em torno dos exames” e que estes tornaram as crianças “mais limitadas, mais angustiadas, mais formatadas e mais individualistas”. As provas são “cegas” ao contexto socioeconómico das crianças que pretende avaliar” e “criaram um processo de desconfiança e de desvalorização sobre o trabalho dos professores”, e concluiu: “Quem é que melhor pode avaliar uma criança de 9 anos? O professor”, afirmou.

Também as Associações de professores de Português e de Matemática, a Confederação Nacional Independente de Encarregados de Educação, a Confederação Nacional das Associações de Pais e a Federação Nacional de Educação, que sempre contestaram os exames externos, apoiaram as aprovações (no Parlamento) ainda que registrem que prefeririam que a extinção fosse precedida por um amplo debate nacional.

Mas, por contradição, há um movimento de um grupo dos professores que vem resistindo ao final da aplicação dos exames externos para os estudantes. Segundo eles: “Nós nos acostumamos a ter e viver profissionalmente em função dos exames e de seus resultados para avaliar nossas práticas. Ficar sem eles nos traz insegurança, parece que ficamos órfãos, sem saber como medir o conhecimento de nossos alunos e de nossa escola”. Cabe lembrar que essa resistência, aos exames externos, nada tem a ver com o bônus, medida não adotada no país.

Na mesma direção, a ex-ministra da educação Maria de Lurdes Rodrigues aponta a impropriedade da decisão, uma vez que essas medidas não foram discutidas com a comunidade e nem houve debates com os representantes e nem com as associações legais dos professores e gestores. “Foi uma medida e uma decisão unilateral imposta e sem qualquer discussão.”

Cabe acompanhar as novas etapas dessa discussão que em muito se assemelha ao que vivemos no nosso país. São movimentos cíclicos que ora pregam privatizações e meritocracia como sinônimo de qualidade para a escola, ora afinam seus conceitos à construção de uma educação de qualidade social para todos.